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Chove Chuva, Chove Com Parar

Compartilho neste texto meus “agro-pensamentos” deste mês de fevereiro. Começando na economia e política os destaques deste mês são relativamente bons. O mais recente Relatório Focus do Banco Central estima o PIB em 2018 crescendo 2,80% e em 2019 outros 3,00%. A inflação seria de 3,84% em 2018 e 4,25% em 2019. Em relação à taxa de juros, estima-se 6,75% em dezembro deste ano e 8,00% no final de 2019 e para o câmbio tem-se R$/US$ 3,30(dez/2018) e R$/US$ 3,39 (dez/2019). Além desta melhora na confiança, tivemos um surpreendente crescimento do PIB de mais de 1% em 2017. Resta torcer que a postergação da fundamental votação da reforma da previdência não freie este ânimo, sendo nosso maior risco neste momento, graças à necessária operação no Rio de Janeiro, que tem minha torcida, para depois se espalhar pelo Brasil. Mas pode trazer ligeira desvalorização do Real, impacto positivo na agricultura exportadora.

No agro deste janeiro as exportações foram de US$ 6,1 bilhões (5% acima de janeiro de 2017) e retirando-se as importações de US$ 1,23 bilhões, ficou um superávit 7% maior, de US$ 4,9 bilhões. Trouxemos US$ 1,23 bilhões no complexo soja, recorde para o mês, seguido pelos produtos florestais com US$ 1,15 bilhão (também recorde) e US$ 1,1 bilhões em carnes com grande destaque para a carne bovina, que aumentou quase 25%. A China aumentou em janeiro suas compras do agro brasileiro em quase 30%, importando US$ 1,16 bilhões e atingindo 19% do total. Bom início de ano ao agro exportador e mais boas notícias à carne bovina, com a declaração do Brasil como livre de febre aftosa com vacinação, que deve nos abrir mais mercados.

Em relação aos preços mundiais dos principais produtos, o índice das commodities alimentares (índice da FAO) ficou estável em 169,5 pontos. Cereais subiram um pouco (2,5%), lácteos (2,4%) e açúcares (1,6%) caíram e tivemos estabilidade em preços de óleos vegetais e carnes. Mas quando comparado a janeiro do ano passado, os preços caíram 3%. A soja deu uma recuperada e puxou o milho, com muitas incertezas ainda pois as chuvas estão maiores que as esperadas em muitas regiões do Brasil, seguindo Jorge Benjor no “chove sem parar”, atrasando a colheita e colocando riscos maiores para a segunda safra e a Argentina está com problemas de falta de chuvas, deixando os mercados mais preocupados.

Mas até então não podemos reclamar, pois o caminhar da safra 2017/18 tem surpreendido e a Agroconsult, com o consagrado Rally da Safra, já acredita ser possível superar na soja as 114,1 milhões de toneladas da safra anterior, mesmo com atrasos de plantios em alguns locais devido ao clima seco no início da safra. Vale observar que com estes atrasos, a situação do transporte para exportação deve ficar mais delicada e trabalhos preventivos do Governo nas principais rodovias, principalmente e BR 163 devem ser feitos, fica o alerta para a prevenção.

A CONAB revisou a sua estimativa de fevereiro para baixo em 1,1%. Produziremos agora de grãos 225,57 milhões de toneladas (5,1% menor que a safra anterior). A área plantada é de 61,01 milhões de hectares, apenas 0,2% maior que a anterior. No milho estão as maiores perdas, cairemos de quase 98 para 88 milhões de toneladas, com menor área e produtividade. Já na soja teríamos 111,5 milhões de toneladas, contra 114 milhões da safra anterior, e em 3,3% a mais de área, portanto com produtividade menor, mas a estimativa atual da soja é maior que a de janeiro.

Isto posto, o MAPA também reduziu a expectativa de renda agropecuária de 2018, para R$ 516,5 bilhões, 1% abaixo da estimativa de janeiro e 5% menor que a última safra, dividida em R$ 343,8 bilhões para a renda agrícola (6,3% menor) e R$ 172,6 bilhões para a renda da pecuária (2,3% menor que 2017).

Destaco também duas notícias no âmbito das organizações, que afetam as tradings e o agro. A primeira, da Bunge que anunciou prejuízo no quarto trimestre de 2016, de US$ 60 milhões, afetado em parte pelas operações com açúcar e etanol, onde a receita caiu 14,2%. Também caíram as margens tanto para industrializar grãos como comercializar no Brasil, refletindo os tempos mais difíceis para as tradings, tema que trabalhei aqui no ano passado. Saíram matérias na imprensa de uma possível fusão com a ADM, criando uma empresa do tamanho da Cargill. A ADM é forte nos EUA e a Bunge no Brasil, e uma nova organização já teria mais equilíbrio. Em 2017, das exportações brasileiras de soja em grãos, a Cargill foi responsável por 9,6 milhões de toneladas, seguida pela Bunge com 9,4 milhões e a ADM com 7,6 milhões.

Para complicar ainda mais a vida das tradings, a reforma fiscal recente dos EUA abriu mais espaço para Cooperativas, e pode levar mais empresas a atuarem desta forma. É o Artigo 199A, que reza aos agricultores a dedução de 20% das receitas nas tributações de rendimentos pelo Imposto de Renda Federal. Para outras empresas também se abate 20%, mas do lucro líquido, estando ai a diferença contra as tradings. Tradings esperam que o Congresso possa alterar esta diferença, mas até que se mude, se é que vai mudar, ficam alterações de canais de vendas já sendo feitas pelos produtores e empresas já começam a se transformar em cooperativas.

Finalizando o mês, a produção vem caminhando bem, confiança voltando com a economia melhorando, em breve reage o consumo e neste momento para os preços devemos observar o clima no Brasil e na Argentina, por causas opostas, excesso e falta de chuvas, que mesmo com boas produções e bons estoques, serão os fatos de destaque. O maior receio é atrasar muito a segunda safra e colocar em risco a produção esperada. Mas estou com um sentimento pós carnavalesco que podemos ter boas surpresas em preços das commodities alimentares neste ano.

Contato: favaneves@gmail.com

 

* Marcos Fava Neves – Professor Titular da Faculdade de Administração da USP, Campus de Ribeirão Preto. Especialista em planejamento estratégico do agronegócio